O financiamento em saúde pública, desde a promulgação da vigente Constituição Federal e criação do Sistema único de Saúde (SUS), assumiu caráter polêmico e vem motivando acirradas discussões entre os que defendem a necessidade de um maior investimento e os que preferem ignorá-la, ou culpar a má gestão desse sistema e dos serviços de saúde.
A discussão é antiga e passa por situações inusitadas de descomprometimento dos gestores públicos. Em 1993, o setor passava por grave crise de financiamento e a Confederação das Santas Casas (CMB) manteve audiência com o ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, e o secretário do Tesouro Nacional, Murilo Portugal, para solicitar mais investimentos no sistema público de saúde. Apesar dos argumentos que apresentamos, respaldados por números consistentes, não se conseguiu sensibilizá-los e, ao final, ouvimos o seguinte comentário de Murilo Portugal: “O SUS é uma utopia e quem quiser saúde tem de pagar por ela”.
Veio o governo Lula e as restrições ao financiamento do setor continuaram, chegando a ser adotadas “manobras contábeis” para não atender aos dispositivos da Emenda Constitucional 29. Fomos várias vezes ao ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo, que se revelou insensível ao problema, preferindo atribuir ao setor a pecha de “má gestão”, tanto na atuação dos gestores do SUS quanto na dos prestadores de serviços. A partir daí, o governo adotou o discurso de que os problemas da saúde não residiam no baixo investimento e sim na má gestão.
Com Dilma Rousseff não foi diferente. Assim como o seu “criador”, Lula, a “criatura” adotou o mesmo discurso, reforçando, ainda mais, a ênfase na má qualidade da gestão praticada pelo setor. Nesses quase quatro anos de governo, o subfinanciamento tomou proporções irresponsáveis, sendo a saúde pública de melhor qualidade a principal reinvindicação da população.
Para 2014, a situação orçamentária do Ministério da Saúde é muito delicada. O ministro Arthur Chioro já manifestou publicamente que o déficit orçamentário supera a casa dos R$ 8 bilhões. O problema maior está no financiamento da Média e Alta Complexidade, pois o orçamento aprovado está em R$ 36,2 bilhões e as ações e serviços já autorizados pelo ministério passam dos R$ 39,5 bilhões.
O cenário atual também é desfavorável para 2015. Não há possibilidade de o governo Dilma aceitar colocar mais recursos na saúde para o próximo ano, independentemente do resultado das eleições de outubro. A proposta orçamentária para o próximo exercício já está sendo elaborada e terá de ser encaminhada ao Congresso Nacional até 31 de agosto. Assim, mesmo que outro(a) candidato(a) vença as eleições à Presidência da República, terá de executar o orçamento a ser aprovado ainda este ano.
Pobre saúde pública! E o povo, que se lasque…
José Luiz Spigolon é diretor geral da CMB (Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas)
Texto publicado originalmente na revista Wareline Conecta – Edição 7 – Julho/2014