O projeto RIC substitui a carteira de identidade por um cartão com chip, biometria e certificado digital. Junto com o avanço do Sped vai impulsionar a migração em massa do mundo real para a rede.
A transformação da rotina diária em uma sucessão de códigos virtuais, processo também conhecido como desmaterialização da sociedade, deverá ganhar impulso importante entre o final deste ano e ao longo de 2011. O responsável será o Registro de Identificação Civil (RIC) digital, projeto orçado em 800 milhões de dólares, a serem gastos nos próximos oito anos, e que substituirá por cartões com chips as velhas carteiras de identidade impressas (os RGs), usadas há 40 anos para o cidadão provar que é ele mesmo. A grande novidade é que, com o RIC, cada cidadão passa a ter um número único, baseado em suas impressões digitais, no Cadastro Nacional de Registro de Identificação Civil. Esse cadastro estará integrado com as bases de dados dos órgãos de identificação dos Estados e do Distrito Federal, na forma da lei.
Outras novidades dizem respeito às tecnologias usadas no RIC. Ele terá certificado digital e biometria (o registro eletrônico das impressões digitais) e, por isso, poderá massificar a criptografia entre as pessoas, assim como fez o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) entre as empresas.
O RIC é um projeto gigantesco, tanto quanto o do sistema Sped. “Em meados deste ano, chegamos a um número emblemático de 1 bilhão de notas fiscais eletrônicas emitidas, depois de dois anos de projeto”, comemora o presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), Renato Martini. “Começou de forma tímida, com várias dúvidas, porque era uma ação BtoB (business to business) que também envolvia os governos estaduais. Agora [em setembro], já são 1,2 bilhão de notas fiscais emitidas, validadas, assinadas digitalmente, que são efetivamente documentos eletrônicos, que já nascem nesse formato. A Souza Cruz, por exemplo, que é um grande emissor de e-nf, pode imprimir sua nota, mas não precisa. A impressão é uma cópia. O original é o digital, um documento com certificado digital de padrão da ICP Brasil.”
Essas 1,2 bilhão de notas representaram, de acordo com o presidente do ITI, a circulação de 8 trilhões de reais na economia brasileira, mesmo sem ter chegado ao varejo. O novo desafio será o avanço do atendimento à base da pirâmide das pessoas jurídicas e o projeto RIC, voltado à pessoa física. “O RIC é a maior janela de oportunidade de fazer a certificação digital chegar ao cidadão comum. As empresas já a usam, não vivem mais sem ela. Mas, para o cidadão, é preciso uma estratégia massificadora”, diz Martini.
Para o piloto de 100 mil, os órgãos identificadores de cada uma dessas regiões habilitadas já estão enviando os
registros (20 mil cada) para a prova projeto total de substituição dos RGs por algo como 150 milhões de cartões munidos de chips, certificação digital e biometria está estimado em 800 milhões de dólares, a serem gastos ao longo de oito anos, nas contas de Airan. Valores que ainda não têm fonte definida e dependem de vontade política das gestões estaduais e do novo governo federal. São Paulo, por exemplo, até a primeira semana de outubro, ainda não havia aderido.
O cronograma geral do projeto estabelece 2 milhões de cartões no primeiro ano (2010/2011); 8 milhões em 2012; e 20 milhões de cartões por ano, a partir de 2012, até cobrir o passivo total. O que a equipe do Comitê do RIC imagina é que os custos sejam compartilhados com os Estados da federação e o setor privado, em especial os bancos.
A lei que criou o RIC é de 97, mas sua regulamentação foi feita só em maio deste ano, por decreto presidencial. Também tramita no Congresso o Projeto de Lei 7316, para regulamentar o uso de assinaturas digitais e a prestação de serviços de certificação digital, até hoje regidos pela Medida Provisória 2.200/2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e transformou o ITI em autarquia, vinculada à Casa CiviL A ideia do PL é flexibilizar exigências e facilitar a transformação dos órgãos identificadores em Autoridades de Certificação. Originalmente, a lei do RIC concentrava no cartão todos os demais documentos pessoais (CPF, PIS/Pasep – ou atual NIS, título de eleitor, etc.). No ano passado, contudo, a Casa Civil entendeu que não havia consenso entre os vários ministérios. “A estratégia, agora, é de adesão e de convencimento. Vamos fazer um documento seguro, com grande qualidade, e ofertar ao País. Naturalmente, outros órgãos vão descobrir suas vantagens e ter interesse em aderir”, explica Martini.
O decreto que regulamentou o RIC também instituiu um modelo de governança para o projeto e o comitê pela sua gestão estratégica e tecnológica, coordenado pelo Ministério da Justiça. O ministério também será responsável pela base de dados biométricos – em que estarão as imagens de todas as digitais – para conferência. Ou seja, se a pessoa perder seu documento, na hora de tirar a segunda via, o órgão identificador vai enviar seus dados biométricos para a central, em Brasília, que devolverá o número associado àquela digital, único e válido para o País inteiro. Atualmente, qualquer um consegue novo número de identidade, basta tirá-la em Estados diferentes. Esses dados, junto com a certificação digital, estarão gravados nos chips do cartão, por sua vez dotados de recursos que acionam sua autodestruição no caso de tentativa de invasão das trilhas.
Martini tem claro o impacto tremendo da digitalização dos documentos e das interfaces por meio das quais as pessoas se relacionam. “Estamos falando é do processo de desmaterialização da vida; trocar o balcão pelo portal da internet, levar os serviços para as redes computacionais.”
Fonte: Computerworld