Engenheiro de software, o canadense Geoffrey Shmigelsky (foto), de 42 anos, chegou a um diagnóstico digno do doutor House – aquele da série de TV. Por dois anos, sofreu de dores no peito. O problema aparecia a cada 17 dias. “Fui a médicos e psicólogos. Tudo em vão”, conta. Decidiu ingressar numa comunidade virtual de pacientes. Com a troca de experiências, descobriu que o problema era causado por um parasita alojado em seu pulmão. “A cura era uma pílula de US$ 10.”
O site acessado pelo canadense – Cure Together (curetogether.com) – reúne portadores de diversas doenças. Ao se cadastrar, o internauta preenche um questionário relatando seus sintomas, os tratamentos que experimentou e os resultados que obteve. O sistema então indica usuários com o mesmo perfil para ele entrar em contato.
O Cure Together é apenas um exemplo da revolução que as ferramentas da web 2.0 – redes sociais, blogs, microblogs e tudo que permita a construção coletiva do conhecimento – estão provocando na forma como as informações sobre saúde são produzidas e disseminadas. O movimento, ainda tímido no Brasil, já tem nome: Saúde 2.0.
“Acreditamos que o paciente deve deixar de ser mero passageiro e se tornar o condutor responsável de sua saúde”, afirma o americano Dave deBronkart, líder da Sociedade pela Medicina Participativa (SPM, na sigla em inglês). Mas ele alerta: a ideia não é que o doente assuma o lugar do médico e sim que se torne parceiro. “Metade dos fundadores da SPM é médico”, revela.
Contudo, há relatos de situações em que a crescente autonomia dos pacientes conectados obrigou médicos e gestores a rever condutas e políticas públicas. Algumas vezes, sem o desejável respaldo científico (mais informações na próxima página).
De qualquer forma, ferramentas como o Cure Together não são úteis só para pacientes. A base de dados desse site, por exemplo, alimenta pesquisas de universidades como MIT, Stanford e Carnegie Mellon. São informações cadastradas por mais de 26 mil usuários – cerca de 230 brasileiros. “Estamos criando uma versão em português”, diz a idealizadora Alexandra Carmichael.
Ao monitorar os temas de saúde mais frequentes nas redes sociais, blogs e sites de busca, cientistas são capazes até de detectar epidemias. Nos EUA, por exemplo, um aumento nas consultas relacionadas a diarreia e intoxicação alimentar no Google serviu como pista para identificar um surto de salmonelose. é o que relata um trabalho publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) em 2009.
Além de serviços parecidos com os do Cure Together, o site Patients Like Me (patientslikeme.com) apresenta estatísticas sobre eficácia e riscos de remédios e outras terapias. Há também uma lista de testes clínicos com novos medicamentos – ainda não aprovados – e o contato das empresas responsáveis.
Até mesmo um ranking com os melhores e piores médicos é possível encontrar nos sites americanos Rate MDs (ratemds.com) e Revolution Health (revolutionhealth.com). A lista dos “top 10” é elaborada com as notas atribuídas pelos pacientes cadastrados.
Muitos argumentam que os comentários feitos nesses sites, por serem anônimos, não são confiáveis. Mas um artigo do NEJM afirma que eles têm algo a ensinar. No texto, a psiquiatra Shaili Jain ressalta que médicos costumam aprender nos livros ou com os colegas o que faz um bom profissional. “Raramente ouvimos os anseios dos pacientes porque, no mundo real, eles não costumam dizer o que pensam cara a cara”, diz ela.
Em relatório de 2010, a consultoria Terra Fórum apontou a Saúde 2.0 como “tendência que transforma a dinâmica de prestação de serviço no setor ao retirar dos profissionais de saúde o monopólio do conhecimento”. “Os médicos sempre serão resistentes, mas, a despeito das críticas, as ferramentas da web 2.0 estão aí. é melhor que você participe e as utilize bem”, diz o consultor Claudio Terra.
Fonte: Estadao.com